A artista pop de Copenhague mags (Margrethe Tang) apresenta Herified, um álbum de oito faixas que traduz desejo, autorreconhecimento e visibilidade queer em uma linguagem pop eletrônica cristalina. Concebido como um projeto afirmativo sobre aprender a amar a si mesma e assumir o próprio lugar no espaço público, o disco transforma a narrativa pessoal no motor de um songwriting direto e melódico.
O conceito gira em torno de uma única palavra: “fascinação”. À maneira das séries de nenúfares de Monet, Herified retorna ao tema do amor por múltiplos ângulos — eufórico, denso, caótico, cristalino — sem perder a linha estética. O próprio título concretiza a ação: transformar o substantivo “her” em verbo, com “-ified”, para marcar a passagem do saber ao fazer. Na prática, significa converter sentimento em movimento e intimidade em canções voltadas à imediaticidade.
Ao longo das oito faixas, mags alterna versos de tom diarístico com refrões nítidos e ganchos precisos, movendo-se entre texturas eletrônicas lúdicas e baladas de grande fôlego. A produção privilegia a clareza em vez do acúmulo, abrindo espaço para vocais sem artifício que dialogam com os eixos do álbum: a exaltação e a apreensão que acompanham o desejo quando ele é vivido às claras e nomeado sem eufemismos.
O projeto também se afirma como um posicionamento sobre representação. Criada no interior da Dinamarca, com poucos modelos visíveis de mulheres queer, mags propõe Herified como um corretivo ao cânone pop herdado. Colocar no centro narrativas de mulheres que amam mulheres não é provocação nem pedido de exceção: é normalidade. Essas histórias pertencem às canções de amor do mainstream; sua escassez é questão de visibilidade, não de universalidade.
O single principal, “blue”, condensa a tese do disco numa celebração descomplicada do enamoramento. Onde os padrões radiofônicos por muito tempo seguiram o roteiro “garoto-encontra-garota”, “blue” estabelece outra premissa: nomear o romantismo queer com naturalidade e confiar em sua ressonância. A faixa funciona simultaneamente como marco pessoal e manifesto artístico: o amor é universal precisamente porque não tem gênero, e à música pop cabe afirmá-lo com precisão e elegância.
A sequência das faixas reforça esse propósito. Passagens leves e efervescentes convivem com momentos mais lentos e densos, desenhando um mapa afetivo que recusa escolher entre o arrebatamento e o acerto de contas. O elemento de coesão é a intenção: visibilidade como prática, não como pose; ofício como veículo de testemunho; e fascinação como disciplina que mantém um único tema — o amor — aberto a variações concretas e inesgotáveis.
No panorama do pop nórdico, conhecido pelo rigor e pela limpidez, Herified soa como uma afirmação compacta e deliberada. O disco consolida a voz de mags — direta e colorida — ao mesmo tempo que amplia quem pode ocupar o centro do relato mais duradouro da música pop. O resultado é um álbum pessoal e expansivo, íntimo e público, sustentado pela convicção de que o autoconhecimento ganha força quando se transforma em melodia.
Data: 5 de setembro de 2025.